terça-feira

A Unidade Que Vem De Fora


Trabalho num sítio onde muito se fala de união e de "vestir a camisola" mas onde cada um tenta falar mais alto que o outro (para argumentar com bogalhos quando, infelizmente, se está a falar de alhos) e onde as dezenas de televisões existentes conseguem estar cada uma num canal diferente também elas a debitar decibéis em níveis desaconselháveis ao ouvido humano. No fundo, a união (por ali tão apregoada) é só uma utopia impossível de alcançar por manifesta falta de (boa) vontade de todos os que ali trabalham. No entanto, por vezes, fico a trabalhar até mais tarde e à noite, já com o local praticamente entregue unicamente "ao meu cuidado", chegam as senhoras da limpeza. Todas africanas, falam em crioulo salvo quando me cumprimentam, naturalmente, em português. Elas são uma equipa; que fala a mesma língua, que limpa, que arruma, que organiza (aquilo que a multidão que se aglomera de dia no meu local de trabalho deixa em pantânas diariamente)... e que, à medida que vai passando pelas dezenas de televisões existentes, as vão sintonizando todas no mesmo canal, para irem acompanhando a telenovela onde quer que estejam a limpar. Ou seja, com o correr dos minutos, noite dentro, o espaço vai deixando de ter 1001 vozes para acabar a ouvirem-se, em uníssono, as personagens da trama do seriado televisivo. É claro que as tv's continuam a debitar decibéis em níveis totalmente totalmente desaconselháveis ao ouvido humano mas, ao menos, todas a uma só voz, dando por fim uma sensação de unidade que, pelos vistos, naquela casa, só existe quando toda a gente sai e chega a equipa da limpeza.

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