quarta-feira

Coisas Simples


Levantar e ligar o rádio para ouvir a rubrica favorita; arrastar os pés pela casa, dar um pontapé no gato que insiste em enrolar-se nas minhas pernas e ainda não aprendeu que todos os dias tropeço nele; chegar à cozinha, abrir o frigorífico, encher uma caneca de leite frio e bebê-lo como se fosse água; detestar lavar a cara com água fria mas fazê-lo na mesma porque assim acordo mais depressa (ainda que mais mal disposto); inconscientemente fazer sempre tudo na casa de banho pela mesma ordem por muito que me chateie e faça sentir velho começar a entrar numa rotina; ter quase sempre um problema em escolher a roupa e aperceber-me que aquilo que me apetece vestir não está passado ou está no cesto da roupa suja; deixar comida seca ao gato antes de sair e pensar sempre que devia ter deixado mais porque nunca se sabe a que horas volto; lavar os dentes com atenção para fazer tudo como o dentista mandou da última vez em que fui à consulta; sair porta fora e, mesmo antes de a fechar, parar… … … olhar para as mãos e ver se trouxe a chave e se pus o relógio, apalpar os bolsos à procura da carteira, da caneta, do telemóvel e do cartão magnético para entrar no trabalho; pensar se não deixei nada que me venha a fazer falta durante o dia; voltar quase sempre a entrar em casa para ir buscar os óculos escuros; sair e fechar, finalmente, a porta; detestar as filas de trânsito quando estou a trabalhar de manhã e curtir a ausência de carros no trajecto para o emprego quando trabalho à tarde; cumprimentar o Sr. Mesquita; pensar todos os dias que já era hora de me passarem do contrato a termo incerto para um contrato sem termo; invariavelmente voltar para casa mentalmente cansado e normalmente bem mais tarde do que devia ter regressado; cumprimentar o gato com turras mútuas; ligar a televisão e só parar o zapping (ainda com o casaco com que venho da rua vestido) em algo que ache que tenha o mínimo interesse; despir; vestir o pijama; calçar os chinelos; dar paté ao gato para o jantar mas, antes, esperar que ele venha ter comigo a espreguiçar as pernas, já a lamber os beiços e que me dê turras nas pernas; abrir o frigorífico, deixar a caixa do paté do gato e encher uma caneca de leito frio; se possível, encontrar pão e Nutella ou então bolachas para o último snack do dia; ver se tenho vontade de escrever alguma coisa nos blog’s e quase sempre ter (e, daí, acabar por me deitar quase sempre bastante tarde); acertar o despertador para o dia seguinte; escolher o canal de televisão com que vou adormecer (adormecer sem TV ligada está fora de questão); desligar-me; dormir.

Coisas simples. Há, obviamente, muito mais na minha vida do que isto. Coisas maiores, mais importantes, mais felizes, mais difíceis e piores. Mas não são simples. E por isso não “cabiam” neste texto. Todos temos nas nossas vidas coisas simples como as banalidades que acabei de escrever. Estas são as minhas. E são elas – também – que fazem de mim o que eu sou.

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